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Como a Super Quarta de hoje pode definir o futuro da bolsa brasileira? | Bolsas e índices


Nesta Super Quarta (1°), os bancos centrais do Brasil e dos Estados Unidos põem as cartas na mesa. O mercado doméstico conhece as mãos das duas autoridades monetárias, por isso boa parte acredita também saber qual será a jogada de hoje: corte de meio ponto no juro daqui, manutenção da taxa americana.

Só que o mais importante não está nesses números, mas nos comunicados e suas implicações nas curvas de juros – em especial a dos EUA, que pode guiar ou dispersar o rali na bolsa brasileira neste fim de ano.

“A principal variável a ser monitorada é o yield [taxa de rentabilidade] do Treasury [título do Tesouro americano]. Se essas taxas se acalmarem, a nossa bolsa pode ter espaço para subir”, disse Felipe Miranda, estrategista-chefe e fundador do grupo Empiricus.

O juro de curto prazo até importa, mas a maior preocupação de investidores hoje é com a taxa de desconto (a que determina a equivalência de um valor futuro no presente) e o custo de oportunidade do capital no mundo, ambos associados à curva longa, que são as projeções do mercado para essas taxas de juros e, na representação visual desses números, seu gráfico apresenta curvas (para cima ou para baixo).

Entre outros fatores, os juros longos (aqueles com vencimentos em 10 anos ou mais) estão subindo nos EUA porque o Federal Reserve (Fed, banco central americano) está enxugando seu balanço, quer dizer, está reduzindo suas posições em títulos públicos sem fazer novas emissões. Além disso, o Tesouro americano está se refinanciando para alongar a dívida governamental – e está fazendo isso pela emissão de títulos de longo prazo.

Se, de alguma forma, os formuladores de política econômica dos EUA derem sinais de que podem frear essa estratégia, aí teríamos uma alteração na tendência de alta na curva longa”, explicou Miranda. Sem esse caminho, a curva de juros só conseguiria inclinar para baixo em outras duas hipóteses: a de haver uma quebra relevante no mercado ou de recessão.

A sessão mesmo assim trará volatilidade para as curvas de juros – algo esperado de um dia de decisões sobre juros – mas um deslocamento duradouro em toda a curva depende hoje de mudanças estruturais na política monetária do Fed.

Por que o destino do título de 10 anos do Tesouro americano importa?

A taxa no radar dos especialistas é especificamente a de rendimento do título de 10 anos da dívida pública dos EUA. O Treasury de 10 anos funciona como um ponto de referência para o mercado global por ser um dos ativos mais negociados do mundo. Assim o patamar de retorno no título baliza o comportamento de investidores.

Com as taxas do Treasury de 10 anos em ascensão, investidores migram para a renda fixa americana, que reúne características atraentes: baixo risco, rentabilidade em dólar (principal moeda de reserva no mundo) e rendimento elevado na comparação com a renda fixa de outros países. Sob essa dinâmica, o ativo também regula o apetite a risco nos mercados.

Se o título estiver com retornos elevados, bancos centrais de outros países tendem a elevar ou segurar suas taxas em patamares mais altos para concorrer com o Tesouro americano e frear a fuga de dólares.

Em seis meses até o último 23 de outubro, a Treasury de 10 anos saiu da taxa em 3,5% para 4,85% – chegando a 5,02% em 19 de outubro. A “empinada” no título acontecer nos últimos três, justamente quando o Fed passou a sinalizar possíveis novas altas nos juros americanos e adotou medidas mais austeras na política monetária. Ao mesmo tempo, há um aumento gradual de risco fiscal nos EUA desde junho, quando o país esteve à beira do calote e depois se intensificaram as discussões sobre o teto da dívida federal.

“E qual é o efeito matemático e financeiro desse juro subir à taxa de 4% para 5% ao ano, como aconteceu de agosto a outubro? Em 4%, o retorno bruto desse papel (em dólar) é de 48% em 10 anos. Em 5%, o ganho já é de quase 63% em 10 anos”, explicou Flavio Conde, analista de ações da Levante.

É por isso que, para o mercado brasileiro, hoje, a Selic exerce um papel secundário no desencadeamento de um fluxo de capital para a bolsa.

Esse juro longo na curva brasileira subiu junto com as taxas da Treasury de 10 anos nos EUA. O título do Tesouro prefixado com vencimento em 10 anos (2033) saiu de uma taxa de 10,8% no fim de julho para 12% no mesmo prazo que o da ascensão das taxas no título americano. “Isso representa um ganho [bruto] de 211% em uma década”, pontuou Conde.

E com uma renda fixa tão vantajosa, quem quer assumir o risco da bolsa? “No curto prazo, ainda há várias forças que podem empurrar essas taxas para cima. No médio prazo, o valor justo do Tesouro americano deveria convergir para baixo, assim o apetite por ativos de risco seria destravado. Mas quando isso vai se concretizar já é difícil prever”, disse Miranda.

Enquanto o estrategista-chefe da Empiricus é mais cauteloso em cravar um rumo para a bolsa no curto prazo, o analista de ações da Levante soa um pouco mais confiante no efeito da sazonalidade – embora não descarte a possibilidade de o comunicado do Fed hoje abortar um eventual rali de fim de ano nas bolsas.

O banco central americano está dando as cartas no cenário para a bolsa brasileira não só pela influência da política monetária americana no mercado doméstico, mas também porque o corte de meio ponto na Selic já é dado como certo.

“Os juros americanos de longo prazo tendem a se acomodar abaixo do patamar atual, dados os ajustes recentes”, disse Conde. “Somado aos resultados das empresas no terceiro trimestre, que tendem a ser positivos, as bolsas devem subir. Principalmente as americanas.”

Miranda reconhece que a bolsa brasileira costuma subir quando o juro cai e, historicamente, os meses de novembro e dezembro trazem uma dinâmica positiva para a renda variável. “Mas nem todo ano é assim. Em 2023, especificamente, tudo depende de para onde vai a taxa de rentabilidade do Tesouro americano”, disse.

Mas uma mudança duradoura nesse fluxo investidor, que apontaria o início de um novo ciclo para as bolsas, só deve acontecer quando o Fed começar a discutir cortes de juros nos EUA, o que descomprimiria os papéis mundo afora. “Aí abriria espaço até para voltarmos a falar de juro a 9% aqui no Brasil”, concluiu Miranda.

 — Foto: Freepik
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