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Com prévia da inflação acima das projeções, o que esperar da decisão de juros do BC? | Moedas e Juros


Ainda que a abertura dos dados do IPCA-15 divulgados pelo IBGE não exiba uma composição amplamente negativa, o quadro inflacionário, atualmente, reforça que o Banco Central não está na iminência de acelerar o ritmo dos cortes de juros. Essa é a avaliação do economista-chefe do Banco Bmg, Flavio Serrano, para quem houve alguma euforia após os dados de inflação de julho e o número de hoje indica que a batalha pela desinflação ainda não foi superada.

“Como tivemos algumas surpresas positivas recentemente, criou-se uma certa euforia e o número de hoje mostra que o quadro não é bem assim. Está melhorando, é inegável, mas a desinflação é lenta e o quadro geral reforça que o BC não está na iminência de acelerar o corte de juros. O próprio Roberto Campos Neto lembrou que a batalha contra a inflação ainda não acabou, que há muito para ser feito, e é exatamente por isso que eles antecipam uma política monetária contracionista”, afirma Serrano.

De acordo com ele, a surpresa do IPCA-15 hoje veio bastante concentrada em energia elétrica e de uma piora nos bens industriais, devido a itens relacionados a higiene pessoal, que exibem grande volatilidade. Por outro lado, os serviços subjacentes desaceleraram, o que torna a leitura do índice “um pouco mais neutra”.

Neste contexto, o Bmg espera que o Banco Central irá manter o ritmo dos cortes de juros em 0,5 ponto percentual nas próximas reuniões, levando a Selic para 11,75% no fim do ano. “Ele pode até acelerar, existe a possibilidade, mas ela estaria muito condicionada a uma surpresa na atividade ou na inflação de serviços e, principalmente, apoiada em uma reancoragem das expectativas de inflação de médio e longo prazo. Com esses 3,5% em que as projeções de 2025 e 2026 estacionaram, vejo pouco espaço para ele acelerar o ritmo dos cortes”, afirma Serrano.

A aceleração dos preços na prévia da inflação de agosto surpreendeu negativamente, mas foi concentrada em itens voláteis. Por outro lado, as medidas de núcleo e serviços seguiram mostrando alguma melhora, ainda que lenta, avalia o economista do PicPay, Igor Cadilhac.

“O número principal surpreendeu todo mundo. Analisando como um todo, as altas se espalharam por praticamente todos os grupos, mas concentrada em alguns itens voláteis, como perfumes, passagens aéreas e automóveis, e também por efeitos sazonais em grupos como habitação, saúde e educação” diz o economista. “Por outro lado, quando a gente olha para os núcleos, acho que atendeu as expectativas. Tanto o acumulado em doze meses quanto a média móvel de 3 meses dessazonalizada e anualizada vieram melhor.”

No caso dos média dos cinco núcleos de inflação, o acumulado em 12 meses caiu de 5,53% no IPCA-15 de julho para 5,30% em agosto, segundo a MCM Consultores.

Já os serviços subjacentes, outra métrica bastante observada pelos analistas e pelo Banco Central, o acumulado em doze meses caiu a 5,4% e a média móvel dessazonalizada e anualizada caiu para 4,7%, diz Cadilhac.

“Não dá para ficar muito otimista com esse número, que ficou muito acima. No checklist do Copom, que detalha o que precisa acontecer para acelerar o ritmo de corte, essa surpresa não se materializou. Mas a composição atendeu as expectativas de queda”, continua.

O PicPay não deve alterar, no momento, as expectativas para o IPCA fechado de agosto, que está por volta de 0,20% a 0,25%, ou do ano, que é de 4,90%.

A abertura do IPCA-15 foi positiva, apesar do número cheio bem acima do esperado pelo mercado, mas a desaceleração nos serviços subjacentes não configura uma “surpresa positiva substancial” – condição descrita pela ata da última reunião de política monetária para que o Copom pudesse intensificar os cortes de juros. Assim, de acordo com o estrategista-chefe da BGC Liquidez, Daniel Cunha, o ritmo de 0,5 ponto percentual no afrouxamento monetário deve se manter daqui em diante.

“Nossa leitura final é que o IPCA-15 de agosto foi mais um dado bom de inflação. O componente de serviços, que o BC está monitorando mais de perto, manteve sua trajetória benigna. Mas ainda não dá para classificar como uma dinâmica substancialmente mais benigna que o esperado. O número vai em linha com o discurso e as ações do BC, que começou recentemente a afrouxar sua política monetária, mas não traz nenhuma informação que possa justificar o aumento no ritmo dos cortes”, afirma o estrategista.

O profissional da BGC Liquidez chama a atenção para os advérbios utilizados pelo Banco Central na ata da sua última reunião de política monetária, quando condicionou uma possível aceleração nos cortes a “surpresas positivas substanciais que elevassem ainda mais a confiança na dinâmica desinflacionária prospectiva” e avalia que, atualmente, a barra para intensificar os cortes de juros parece elevada.

A reação no mercado de juros, segundo Cunha, está alinhada à perspectiva de que a autoridade monetária deve manter uma postura mais conservadora no seu ritmo de cortes.

“Claramente você vê os vértices mais curtos mais pressionados em relação aos mais longos. É uma reação clássica a um BC que deve realizar um afrouxamento monetário em um cenário-base mais conservador na redução de juros. Vemos os vértices iniciais da curva realmente refletindo uma probabilidade maior de manutenção do ritmo de 0,5 p.p do que se tinha até o fechamento de ontem”, afirma.

A aceleração maior que o esperada da inflação na prévia de agosto mostra uma composição mais negativa, que não pode ser atribuída apenas a itens pontuais, como a normalização dos preços dos automóveis, avalia o economista-chefe da Constância Investimentos, Alexandre Lohmann.

Ele avalia que a surpresa deve provocar revisões e levar as expectativas a voltarem a subir, afastando de vez a chance do IPCA fechar 2023 dentro do intervalo da meta, que vai até 4,75%.

“O dado joga água fria no cenário do mercado, a distribuição das expectativas para o IPCA-15. As expectativas haviam deixado de cair já com o reajuste dos combustíveis e agora devem voltar a subir”, diz o analista. No último boletim Focus, do Banco Central, a expectativa para 2023 havia subido de 4,83% para 4,90%.

Lohmann chama atenção para a piora, ainda que marginal, de indicadores importantes da abertura, como a dos serviços subjacentes, que passou de 0,19% no IPCA fechado de julho para 0,27% na prévia de agosto, ou a média dos 5 núcleos de inflação, que passou de 0,18% para 0,34% na mesma comparação.

“Alguns podem avaliar que isso tem relação com a recomposição dos preços dos automóveis novos, após o fim do programa de descontos do governo. Só que o núcleo mais impactado por esse item, o “EX0”, acelerou 0,10%, ou seja menos que os demais, que aceleraram 0,16%”, pondera.

Ele nota ainda que a difusão de praticamente todos os grupos voltou a subir, exceção feita à dos alimentos. “Só que isto é uma sazonalidade do terceiro trimestre. No quarto, ela volta a crescer, puxada pelas festas de fim de ano”, diz.

Outro ponto de atenção é sobre a inflação de serviços. Algumas análises, diz chamam atenção para o viés altista trazido pela alimentação e pela alta do preço de combustíveis, mas também colocam viés baixista para os serviços. No entanto, argumenta, se repertirmos a taxa dos serviços subjacentes do IPCA-15 até o fim do ano, a inflação de serviços termina 2023 em 5,04%, cerca de 0,40 ponto percentual (p.p.) abaixo do consenso atual.

“Se levarmos consideração a sazonalidade de fim de ano e também o impacto da alta dos preços da querosene, que deve afetar o preço das passagens aéreas, tem bastante chance desse choque ultrapassar ser superior a essa diferença”, diz.

Com informações do Valor PRO, serviço de notícia em tempo real do Valor Econômico.

— Foto: Getty Images



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