Câmbio

Jornada do Ibovespa começa em calmaria, mas a tempestade se aproxima | Bolsas e índices


Yo-ho! Se o mercado se aproxima ou não de uma tempestade e que dimensão ela tomará, caberá à quarta-feira responder. Como já era esperado, esta jornada de uma semana começou pelo avanço sobre águas calmas, ainda que turvas. A segunda (13) sem comoções, graças à agenda econômica esvaziada, deu espaço para investidores calibrarem as carteiras enquanto se preparam para o que virá nos próximos dois dias – e para quanto capote conseguirão levar.

LEIA TAMBÉM
Boletim Focus: Após mudança no Copom, mercado projeta inflação e Selic maiores
Economistas projetam mais cortes na Selic do que investidores. E daí?

  • Hoje, nem o Boletim Focus mais pessimista sacudiu o Ibovespa, que defendeu sua alta do começo ao fim do pregão. O índice fechou o dia com 0,44% de ganho, aos 128.155 pontos. No mês de maio, tem alta parcial de 1,77%, mas no ano acumula baixa de 4,49%.

Não é que investidores estejam mais otimistas, mas simplesmente já tinham cristalizado um cenário de mar revolto adiante. A decisão do Copom da última quarta antecipou um horizonte de inflação e Selic maiores no curto prazo. Então, nada novo nessa rota.

Nessa passada cautelosa, a carteira teórica mais famosa do Brasil girou R$ 14 bilhões nesta segunda, abaixo da média diária de R$ 17,4 bilhões nos últimos 12 meses.

  • O dólar comercial também beirou o zero a zero por quase toda a sessão, até fechar em queda de 0,13%, a R$ 5,15. Em maio, o câmbio à vista já desvalorizou 0,81%, devolvendo parte dos ganhos acumulados em 2024, atualmente de 6,14%.

O temor para esta semana reside nos dados de inflação ao consumidor medidos pelo CPI (sigla em inglês para Consumer Price Index) de abril nos Estados Unidos, que serão conhecidos em pouco menos de 40 horas.

Vindos mais fracos ou mesmo em linha com o esperado, agentes de mercado devem se sentir mais confortáveis com as apostas em dois cortes nos juros americanos este ano. Do contrário, o cenário é mais sinistro, e investidores devem exigir mais prêmio pelos ativos de risco.

O anseio nasce da falta de respostas. Nem o Federal Reserve (Fed, banco central americano) sabe atualmente que rumo tomará a política monetária até o fim deste ano. Está no tal modo “data-dependent” (dependente dos dados). Em meio a tudo isso, formou-se um redemoinho com a capacidade de dragar tudo para as profundezas.

Não é mais história de marinheiro, a estagflação é um risco palpável no mercado americano desde o mês passado, quando foi divulgado o “PIBinho” dos EUA no primeiro trimestre.

O fenômeno é o pior dos mundos, em que se combinam estagnação econômica – baixo crescimento ou recessão econômica – com inflação resiliente e em níveis acima das metas. Quando isso acontece, os bancos centrais patinam sob gelo: manter os juros altos prejudica a economia, mas cortá-los pode provocar um repique dos preços.

E no maior mercado do mundo, a estagflação é desastrosa como uma avalanche. Para o Brasil, a desaceleração econômica dos EUA representa menor demanda por commodities, o que tende a derrubar os valores das matérias-primas e pode afetar 35% das empresas na carteira do Ibovespa.

Já a alta resiliente de preços lá fora, que demanda juros altos por mais tempo, pode ter no câmbio um vetor de importação dessa inflação. Com a fuga de dólares do Brasil com destino a mercados mais seguros, o real tende a se desvalorizar.

A bolsa brasileira vem funcionando como um barco sem motor, atualmente rebocado pelo navio que é o mercado americano. Quer dizer, no contexto global, o Ibovespa está mais para um bote inflável. E não daqueles salva-vidas, mas dos usados pelos investidores aventureiros que desejam se arriscar para experimentar a fúria do mar de perto.

Ainda que fatores internos impactem a bolsa, o que define mesmo a direção no Ibovespa atualmente são os juros americanos. Na esperança de estarem as taxas do Fed estarem próximas de cair, a sede por aventura aumenta e contamina o mercado doméstico. Do contrário, tripulantes vão buscar refúgio bem longe do pequeno bote – à essa altura sempre de ponta-cabeça.

Mas os dias de emoções na bolsa têm sido raros, e hoje não foi diferente. A curva das Treasuries (que reflete em que taxas estão sendo negociados os contratos futuros dos títulos públicos americanos) rondou os ajustes, com taxas andando praticamente de lado.

Só por isso hoje o Ibovespa conseguiu navegar com seus dois “remos”: Vale e Petrobras. A alta das commodities deu tração à alta dos dois pesos-pesados, com quase 27% da carteira teórica, que tiraram a bolsa da prometida pasmaceira.

“Entre os destaques setoriais, ações mais defensivas andaram melhor. Além das petrolíferas, o setor financeiro teve ganhos relevantes hoje, com destaque para Itaú Unibanco, que é uma das nossas preferidas, e para o BDR [certificado ações negociadas no exterior] da Stone, que também divulga seus resultados hoje à noite”, avalia Larissa Quaresma, analista da Empiricus Research.

Só que, sem terra à vista, o Ibovespa continua patinando no mesmo patamar desde meados de janeiro.

Amanhã, agentes daqui vão escavar a ata do Copom atrás dos argumentos que provocaram o dissenso do colegiado. O time do “corta menos” levou a disputa com o voto de minerva do presidente da autoridade monetária, Roberto Campos Neto, ele mesmo com os dias contados à frente da autarquia.

“A ata será importante para esclarecer o porquê da divergência na decisão da Selic, que opôs os membros do Copom indicados pelo governo atual e os nomeados pelo governo anterior”, explica Larissa. “Se o motivo desse racha foi político será lido como algo bem ruim, mas uma discussão técnica é melhor e também possível, porque havia argumentos que justificassem a queda de meio ponto.”

No entanto, a Empiricus Research entende que, do ponto de vista técnico para o horizonte relevante de política monetária, o corte de 0,25 ponto percentual fazia mais sentido naquele momento. A analista lembra que as projeções para inflação em 2025 ficaram desancoradas após o governo alterar a meta fiscal para o ano que vem de superávit para déficit zero. Sinal que o equilíbrio das contas públicas foi preterido contra o cumprimento da agenda política.

Outra dúvida que não cala no mercado: o BC sob seu novo capitão conseguirá manter a independência ou estará à mercê do jogo de governo?

Questões para o futuro. Ao menos hoje, a curva de juros futuros, termômetro das expectativas de negociantes para as taxas, refletiu apenas a placidez no mercado.

  • Prêmios em contratos de mais curto prazo estão mais ligados às expectativas de investidores para a Selic. A Taxa de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 reajustou de 10,30% para 10,32%. Já para janeiro de 2034, escorregou de 11,84% para 11,80%. Quão mais longo o prazo, maior a influência do cheiro de calote do governo (“risco fiscal“, se preferir).

bote mar bolsa à deriva calmaria — Foto: Freepik/Imagem gerada por IA
bote mar bolsa à deriva calmaria — Foto: Freepik/Imagem gerada por IA



Valorinveste

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo