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Em ano difícil para os fundos multimercados, veja os poucos que batem o CDI | Fundos Multimercados


A classe dos fundos multimercados anda frustrando os investidores em 2023, após um 2022 de bons rendimentos. O ano está difícil para os gestores porque boa parte deles se baseia em cenários macroeconômicos de médio prazo para se posicionar, mas os acontecimentos econômicos estão levando o mercado a mudar as percepções rapidamente. Assim, os profissionais estão com dificuldade de identificar tendências macroeconômicas duradouras.

A maioria desses produtos rendeu abaixo do CDI, indicador de referência para os investimentos em geral, de janeiro a setembro. O Índice de Hedge Funds Anbima (IHFA), indicador de referência para a classe, avançou ao redor de 5% nos primeiros nove meses deste ano, bem menos do que o CDI, que subiu em torno de 10% nesse intervalo. Não é por acaso que os fundos multimercados registraram resgate líquido, descontando as aplicações, de R$ 57 bilhões nesse período.

Contudo, como sempre, alguns produtos renderam muito bem. Casas como Canvas Capital e Matera RC Gestão de Recursos alcançaram rentabilidade de até 17% de janeiro a setembro, conforme um estudo elaborado por Marcelo d’Agosto, consultor financeiro responsável pelo Guia de Fundos do Valor e blogueiro do Valor Investe, com base em dados da plataforma Morningstar.

Melhores fundos multimercados do ano

Fundo multimercado Retorno de janeiro a setembbro (em %) Retorno no 3º trimestre (em %) Retorno em setembro (em %) Retorno nos últimos 12 meses (em %) Risco Patrimônio líquido sob gestão (em R$) Número de cotistas
Canvas Vector FIC FIM 17,67 2,49 -0,72 24,07 6,70 130 milhões 905
RC Hedge FIM 17,45 9,90 0,08 24,07 6,76 50 milhões 345
Mapfre Inversion FIM 15,79 -0,59 -0,48 17,73 9,02 82 milhões 4.335
Sparta Cíclico FIC FIM 14,57 3,67 9,27 16,58 18,16 52 milhões 1.065
Sterna Total Return FIC FIM 14,23 8,28 1,81 20,86 6,77 57 milhões 593
Vinci Total Return FIC FIM 13,94 -1,78 -1,47 7,89 16,63 221 milhões 1.900
Quantamental Cartor Mach5 FIM 13,22 -0,27 -2,35 14,05 8,62 82 milhões 25
Galápagos Evolution FIC FIM C Priv 13,07 2,44 0,63 16,22 2,43 118 milhões 733
Kínitro 30 FIC FIM 12,80 2,81 1,06 17,36 2,11 342 milhões 655
Pandhora Essencial FIC FIM 11,50 6,48 4,53 12,31 7,69 74 milhões 1.702

*Os fundos da lista estão efetivamente disponíveis para os investidores em bancos e corretoras e possuem histórico de pelo menos 12 meses, patrimônio líquido acima de R$ 50 milhões e pelo menos 100 cotistas. Fundos espelhos, que espelham outros fundos de investimentos, foram excluídos dos rankings.

É bom lembrar que esses produtos podem apostar em altas e baixas de ações, câmbio, commodities e juros, no Brasil e no exterior. Até os melhores podem sofrer acentuadas altas e baixas, o que é importante para o investidor mais conservador ponderar na hora de escolher entrar. Além disso, embora esta lista seja sobre o retorno dos primeiros nove meses do ano, para explicar aos leitores o que aconteceu nesse intervalo, é aconselhável que o desempenho dos fundos multimercados seja avaliado em janelas mais longas.

O diferencial dos melhores

O humor do mercado mudou no terceiro trimestre. O pessimismo cresceu com o Brasil e o exterior. Em geral, os poucos gestores de fundos multimercados que acertaram a mão de janeiro a setembro já estavam mais pessimistas antes da maioria do mercado e se anteciparam a essa mudança de perspectiva. Eles apostaram que a bolsa brasileira não deslancharia, o dólar se fortaleceria e os juros não recuariam na intensidade esperada pelo mercado.

O desempenho do Ibovespa mostra essa mudança de humor. O indicador diminuiu a alta de 7,61% no primeiro semestre para 6,22% de janeiro a setembro. Apenas no terceiro trimestre, acumulou baixa de 1,29%.

A aprovação do arcabouço fiscal e a manutenção das metas de inflação em 3% ao ano derrubaram as expectativas de inflação e, finalmente, a taxa Selic. Entretanto, a esperada migração dos investidores da renda fixa para a renda variável foi contida por riscos internacionais e fiscais.

Agosto e setembro foram meses de choque de realidade para a China e os Estados Unidos, as mais influentes economias. A atividade econômica da China demorava para deslanchar e, nos Estados Unidos, a trajetória de juros continuava ascendente, com os rendimentos dos títulos do governo dos EUA disparando ao maior nível em 15 anos até aquele momento.

No Brasil, a euforia com o recuo da Selic deu lugar à cautela com os rumos da taxa. Além de estar preocupado com o exterior, o mercado não acreditava que seria possível a meta do governo de zerar o déficit fiscal em 2024. Esse era o cenário pelos quais os gestores navegaram.

O que fizeram os líderes

A Canvas Capital, casa criada em 2012 com R$ 2,3 bilhões sob gestão, é a dona do fundo multimercado mais rentável de janeiro a setembro, o Canvas Vector. A casa acertou adotando uma estratégia diferente de boa parte das gestoras.

A Canvas se baseia em uma ideia de que é muito difícil prever retornos de curto prazo consistentemente melhores do que a média do mercado e, por isso, prioriza a construção de uma carteira rica em “yield”. Esse é o rendimento dos ativos, a diferença entre o valor investido e o que retornou após o investimento na forma de lucro.

Essa estratégia permite que às vezes a casa entregue retorno positivo até na ausência de favoráveis movimentos nos preços dos ativos da carteira do fundo, o que aconteceu neste ano. O objetivo é entregar CDI mais 5% ao ano.

“Entendemos que o nosso tempo, energia e conhecimento são melhor empregados em uma carteira rica em yield. Foi esse componente de renda dos ativos que contribuiu para o retorno do fundo neste ano”, afirma Francisco Funari, diretor de investimentos da área de produtos sistemáticos da Canvas Capital. “Dado o aumento dos juros dos títulos americanos neste ano, perdemos dinheiro com o componente oriundo da variação dos preços dos ativos, mas ganhamos com yield”, diz.

Os ativos que mais contribuíram para o retorno do produto nos primeiros nove meses deste ano foram as moedas, porque a combinação de aversão a risco e alta dos juros americanos levou a meses de dólar forte. Já os ativos que mais contribuíram negativamente foram os juros. A narrativa de juros “mais altos por mais tempo” nos Estados Unidos prejudicou os títulos dos governos que estavam na carteira do fundo.

Já a Matera RC Gestão de Recursos, casa criada em 2008 com R$ 279 milhões sob gestão, é a dona do segundo fundo multimercado mais rentável dos primeiros nove meses deste ano, o RC Hedge. A gestora conseguiu chamar a atenção apostando que o Comitê de Política Monetária (Copom) começaria a cortar os juros em 0,50 ponto percentual, de 13,75% ao ano para para 13,25% ao ano, em agosto, o que se concretizou.

A Matera RC ainda obteve sucesso com a venda de ações nas bolsas americana e brasileira. A casa acha que o Brasil será penalizado caso não aumente a arrecadação ou corte gastos e se o cenário externo se materializar para o pior, com uma recessão americana em 2024.

Com o aumento dos juros americanos, o Brasil pode sofrer muito. Acho que o Banco Central deve manter reduções de 0,50 ponto percentual na Selic até a taxa alcançar 11% ao ano e depois deve parar os cortes até atingir ao redor de 10% ao ano”, afirma Claudio Coppola Di Todaro, gestor da Matera RC. “O cenário está mais favorável para ter um portfólio de renda fixa do que de ações”, diz.

Outra casa que se destacou com seu fundo multimercado foi a Sterna Capital, criada em 2021 e com R$ 66 milhões sob gestão. A gestora ganhou dinheiro estando mais pessimista do que a maioria do mercado, apostando na baixa da bolsa, no dólar forte e nos juros em níveis superiores aos previstos pelo mercado.

A indústria errou com as estratégias dedicadas ao Brasil, mas conseguimos ser vitoriosos. Desviamos das armadilhas que o Brasil nos expôs nos últimos 12 meses”, afirma Bruno Magalhães, diretor de investimentos da Sterna. “No passado recente, o mercado ficou muito otimista com o Brasil após a aprovação do arcabouço fiscal, mas os ativos estavam caros”, diz.

Ele discorda da narrativa de que o começo de cortes de juros é benéfico para a bolsa. “Fala-se que quando os juros recuarem para menos de 10% e os brasileiros deixarem de ganhar 1% ao mês, eles voltarão para a bolsa. Eu discordo”, afirma. “Na hora que os juros recuarem para menos de 4%, aí sim o fluxo para a bolsa aumentará. Acho que cortes de juros da casa de 13% para 10% ao ano não vão fazer diferença”, diz.

A Kinea não está na lista dos melhores fundos multimercados de janeiro e setembro, mas chamou a atenção com o desempenho do seu fundo Kinea Atlas II no terceiro trimestre. A casa também se destacou apostando que o corte de juros seria menor do que o mercado previa e que o dólar se fortaleceria.

“Tínhamos uma visão de que o mundo não era tão rosa quanto se pintava e virou um imenso Brasil. Com os altos juros lá fora, não teria jeito de o Brasil cortar juros como queria”, afirma Ruy Alves, gestor de multimercados da Kinea. “Continuamos ‘vendidos’ [apostando na queda] em bolsas lá fora, nos protegendo com dólar e ‘comprados’ [apostando na alta] em algumas ações no Brasil, mas nunca entramos no oba-oba de que a bolsa vai decolar com os cortes de juros”, diz.

Alguns fundos multimercados com estratégias long & short chamaram a atenção também. Casas como Távola Capital e Real Investor atingiram rendimentos de até 21% de janeiro a setembro.

Melhores fundos long &short do ano

Fundo long & short Retorno de janeiro a setembbro (em %) Retorno no 3º trimestre (em %) Retorno em setembro (em %) Retorno nos últimos 12 meses (em %) Risco Patrimônio líquido sob gestão (em R$) Número de cotistas
Távola Equity Hedge 15 FIM 21,53 5,86 1,70 26,98 4,13 211 milhões 6.406
Real Investor FIC FIM 21,45 3,87 0,95 21,42 6,72 442 milhões 8.003
Polo Norte I Long Short FIC FIM 19,04 0,23 -2,26 7,69 16,99 93 milhões 1.190
Sharp Long Short Feeder 2X FIC FIM 11,42 4,33 1,22 15,14 1,87 1 bilhão 296
AZ Quest Total Return FIC FIM 11,33 4,65 3,18 16,61 7,10 57 milhões 2.135
Truxt I Long Short FIC FIM 10,99 2,48 0,70 6,32 8,08 34 milhões 26
Sharp Long Short FIM 10,02 3,64 1,03 13,39 0,98 106 milhões 105
Claritas Long Short FIC FIM 9,81 4,02 1,59 13,67 2,35 192 milhões 757
Moat Capital Equity Hedge FIC FIM 8,65 2,50 -0,25 7,86 4,81 760 milhões 8.396
Safra Kepler Equity Hedge FIM 8,58 3,30 1,05 11,05 2,03 232 milhões 1.983

Os gestores desses produtos escolhem pares de ações, que podem depender do mesmo cenário ou ser do mesmo setor, por exemplo. Os profissionais esperam que as ações compradas tenham desempenho relativo melhor do que as vendidas, para ganhar com essa diferença. De um jeito simplificado, em um cenário de alta, a aposta é que os papéis “comprados” subam mais que os “vendidos”, ou, em um mercado de baixa, que eles caiam menos.

Como escolher bons fundos multimercados

Apesar deste ano estar duro para a classe, bons fundos multimercados seguem indicados para diversificar a carteira e ganhar mais que o CDI, focando em três anos ou mais. Um bom jeito de escolher os produtos que conseguem entregar rendimentos altos e consistentes ao longo dos anos é analisar como o fundo se comportou durante diferentes momentos no passado e onde os profissionais trabalharam.

Casas com mais idade e volume de recursos sob gestão, acima de alguns bilhões, contam com mais confiança do mercado. Além disso, é um bom indicativo se a gestora possui um grande número de pessoas, que trabalham lá desde o começo.

Alguns produtos correm mais riscos e, por isso, tendem a ser mais voláteis, mas às vezes as gestoras têm fundos parecidos que correm menos riscos e tendem a ser menos voláteis. É aconselhado escolher o que mais combina com o perfil e objetivos do investidor.

Além disso, alguns produtos estão fechados para receber alocações, porque os gestores não têm condições de gerir mais recursos. Contudo, alguns abrem eventualmente e são oferecidos pelas plataformas de investimentos.

 — Foto: Getty Images
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