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Assessoria de investimentos rumo aos 50 mil? – Opinião


É cada vez mais comum depararmos com artigos e pessoas que tratam a assessoria de investimentos como se fosse uma atividade recente, criada na primeira metade do Século XXI, com o surgimento das plataformas digitais.

Muitos ficam surpresos quando comento que o antigo agente autônomo de investimentos foi regulado pela primeira vez em 1967, pelo Banco Central do Brasil. Vale lembrar que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), atual regulador e fiscalizador do setor, só foi criada em 1976.

Fica fácil de entender essa “confusão” que alguns fazem quando analisamos o histórico e a evolução da profissão nas últimas décadas e, em especial nesses últimos 10 anos, em que a profissão de fato se consolidou e ganhou notoriedade e relevância junto ao regulador, ao mercado e aos investidores.

Segundo dados da ANCORD, entidade responsável pela certificação do profissional, 80% dos atuais 25.345 assessores credenciados e registrados na CVM possuem entre 18 e 45 anos de idade, ou seja, a maioria deles começou a trabalhar a partir dos anos 2.000 – e muito provavelmente a data de registro de grande parte deles possui menos de 5 anos.

Ao pesquisarmos os dados cadastrais dos assessores de investimentos fica mais evidente essa constatação, que por vezes fazem as pessoas terem a impressão de ser uma profissão recente.

Se quebrarmos os profissionais que apresentam o “status” funcionamento normal, em janelas de 10 anos, encontramos a seguinte evolução média de novos assessores.

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Período Média/Ano
2001 – 2010 144
2011 – 2020 835
2014 – 2023 2.190
Últimos 10 anos 2.313

Fonte: CVM (maio de 2024)

Obs.: O portal de dados da CVM possui dados a partir de 2001

Ao analisarmos o quadro acima, não nos restam dúvidas de que a repaginação do profissional com o advento das plataformas digitais, a partir da primeira década dos anos 2.000, foi crucial para chegarmos no estágio atual. Mais! pensarmos em 50 mil profissionais para os próximos 5 anos não é nenhuma “loucura”.

Porém, é importante frisar que nem tudo são flores e céu de brigadeiro nesse mercado e que, para de fato essas previsões se concretizarem, muito precisa ser feito no processo de amadurecimento do mercado.

E por que afirmo isso? Porque se usarmos as mesmas janelas de 10 anos para analisar o número de assessores que desistiram da profissão, pelas mais variadas razões, e que se encontram com o “status” cancelado na CVM, encontramos esse resultado:

Período Média/Ano
2001 – 2010 92
2011 – 2020 94
2014 – 2023 1014
Últimos 10 anos 1020

Fonte: CVM (maio de 2024)

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Obs.: O portal de dados da CVM possui dados a partir de 2001

Ou seja, muito embora o número de profissionais em operação normal venha crescendo de maneira explosiva nos últimos anos, o número de profissionais que desistem da atividade beira mais de 30% no mesmo período, sendo que desses 85% o cancelamento é pedido pelo profissional.

Na média, a solicitação do cancelamento do registro na CVM é de 2 anos após entrar na atividade e esse dado, sim, nos preocupa e merece um pouco de atenção – se de fato temos a pretensão de sermos 50.000 em atividade nos próximos anos.

Por que será que muitos desistem da assessoria num espaço de tempo tão curto, como temos verificado nos últimos anos?

Muitas podem ser as razões e citarei algumas delas, sem desmerecer outras que porventura não foram contempladas aqui:

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  • Falta de perfil adequando para a atividade;
  • Impacto dos juros altos nos últimos anos;
  • Falta de transparência e clareza sobre os desafios da atividade;
  • Abertura de vagas CLT nas instituições financeiras tradicionais;
  • Ausência de empatia e “fit” cultural com o escritório e/ou a plataforma.

Não podemos esquecer que o mercado passou por um período de dinheiro farto para os escritórios e que nesse momento, como contrapartida para se atingir os gatilhos contratuais, muitos saíram abrindo diversas filiais e atraindo profissionais bancários com pagamento de luvas – nunca visto nesse mercado –, mas que, na prática, não resultaram em conversão de novas contas ou aumento substancial do AUC (Asset Under Custody).

Passou a ser comum, também, a atração de jovens promessas, para a atuação em SDR (Sales Development Representative), com um salário fixo garantido por um período, mas que nem sempre prosperaram ou atingiram as expectativas, alimentando o “turn-over”.

Isso tudo acabou resultando em uma queda mensal de novos assessores (398) em 2023, quando comparado a 2022 (436), ao mesmo tempo que aumentou o número de cancelamentos no mesmo período de 122 para 170.

E quais são os cuidados que os times de expansão devem ter para evitar esse “turn-over” alto, que no final gera prejuízo, desgaste e frustação para todos, além de afetar o investidor?

Independente da estratégia de crescimento que o escritório tenha, seja ele orgânico ou não, com abertura de filiais ou não, com atração de profissionais experientes ou jovens promissores, entendo que o conceito dos 3 K’s seja válido para todas elas, pela simples razão de que a atividade de assessoria de investimentos é 100% meritocrática e muito próxima ao perfil empreendedor.

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Capital intelectual: o mercado financeiro se sofisticou nas últimas décadas de uma maneira tão expressiva que para atuar nele em determinadas funções é necessário que você seja certificado e faça programas de educação continuada. Isso por si só já exige da pessoa o mínimo de interesse em leitura e dedicação aos estudos.

Se levarmos em consideração que, para entendermos os mais diversos instrumentos financeiros e como alocar os recursos dos investidores nos cenários econômicos projetados, há necessidade de bastante conhecimento, fica claro a incompatibilidade da atividade com quem não se atualiza diariamente.

E para concluir a importância do capital intelectual, o ato de prospectar um cliente não é tão trivial e, portanto, você precisa ter a habilidade e a capacidade para conversar e entender, mesmo que superficialmente diversos temas e assuntos – não necessariamente voltados ao mercado financeiro.

Capital financeiro: esse é um ponto sensível que, por vezes, não é lembrado no ato de atrair um novo assessor ou se é, talvez, não com a transparência devida, mas sim com as promessas e projeções de ganhos futuros, que podem não se concretizar e causar frustação.

Mesmo que você negocie luvas ou uma remuneração fixa por um período, lembre-se que não há almoço grátis e que tanto as luvas recebidas ou o salário garantido têm um retorno esperado por parte do escritório. A conta chegará mais cedo ou mais tarde.

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Prospectar clientes custa dinheiro. Então, ao decidir se tornar um assessor de investimentos tenha isso em mente. Qual o tamanho da sua reserva financeira e, por quanto tempo, ela deverá durar para que o seu projeto na assessoria mature e se retroalimente?

Capital social: por último, mas não menos importante, verifique o capital social do candidato. A atividade de assessoria no seu “core” é captar e prospectar clientes com o intuito de oferecer produtos e/ou serviços do(s) intermediário(s) ao(s) qual(is) está vinculado. Portanto, uma pessoa introvertida, que não gosta da vida social, que não gosta de falar ao telefone e que acredita que o básico “family and friends” é o suficiente para obter o sucesso, na maioria das vezes, poderá estar fadada ao fracasso.

Francisco Amarante, superintendente da ABAI (Associação Brasileira dos Assessores de Investimentos)



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