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A maldição de maio voltou! E jogou o Ibovespa para o menor nível dos últimos 6 meses | Bolsas e índices


Parecia que ia dar. No fim, não deu. Maio tinha tudo para ser o segundo mês em 2024 que o Ibovespa conseguiria fechar positivo. Mas não foi desta vez. O único mês deste ano que a bolsa brasileira fechou no azul segue sendo fevereiro.

Mas foi quase. Em 17 de maio, o índice, que até então anotava ganho de 1,87% no mês, inclinou para baixo. E então foi para uma queda vertiginosa. Três pregões depois, no dia 22, o saldo do Ibovespa já tinha virado.

A perda deste mês interrompe uma sequência dos cinco anos que Ibovespa sustentou contra a maldição das bolsas:sell in May and go away (venda em maio e vá embora, numa tradução livre). Quer dizer, a última vez que a fuga da bolsa em maio derrubou o índice foi em 2018.

Velha conhecida do mercado financeiro, a frase faz referência ao padrão histórico de comportamento dos investidores, especialmente os do Hemisfério Norte, de venderem ações em maio, período que antecede as férias de verão, para voltarem às bolsas só em novembro, à beira das datas comerciais e do inverno.

  • Por ter reavivado a esperança de virada do Ibovespa em 2024, a inversão do cenário fez a perda ser mais amarga, de 3,04% no mês, para os 122.098 pontos em que encerrou esta sexta (31). E a queda de 0,5% no pregão de hoje, a sessão serviu apenas para o índice renovar, pela terceira vez seguida, seu menor patamar nos últimos seis meses. Com mais esse baque, o saldo da carteira teórica em 2024 está negativo em 9%.

Foi sempre assim. O Ibovespa dá um passo em frente e então dá outros dois para trás. Ainda que, no filme, o índice tenha avançado mais do que recuado – ou jamais teria escalado ao atual patamar dos 120 mil pontos -, o retrato da bolsa ainda é frustrante.

A queda deste mês jogou o mercado no passado, para 13 de novembro de 2023, sessão que fechou nos 120.410 pontos. À época, investidores ainda estavam cercados de dúvidas sobre os rumos da política monetária americana. Assim como também estão hoje.

Só que, nesse meio do caminho entre o então e o agora, o mercado se cercou de certezas: as de que os juros dos Estados Unidos cairiam logo, em março de 2024. Em dezembro, viam de seis a sete cortes nas taxas americanas este ano. Apostas que levaram o Ibovespa à sua máxima histórica, nos 134.193 pontos.

Aí vieram seguidas frustrações do mercado com as economias de fora e daqui, levando o índice a perder quase 9% do seu pico, alcançado em 27 de dezembro, ao poço em que está hoje.

O que aconteceu com os ganhos de maio?

Neste ano até aqui, o protagonista na narrativa dos mercados é o juro americano. A diferença para os meses anteriores foi que maio não trouxe grandes novidades sobre os rumos da política monetária nos EUA. Mas aí o risco fiscal conseguiu tomar os holofotes neste mês.

Aqui no Brasil, a desconfiança do mercado em relação ao comprometimento do governo com a meta fiscal foi a níveis alarmantes. O CDS (Credit Default Swap) do Brasil com vencimento em cinco anos (o mais negociado no mercado global) disparou 35,2% ontem, aos 197,96 pontos, patamar mais alto desde 6 de junho de 2023 (199,4 pontos). No mês de maio, entre altas e baixas, o papel acumulou alta de 35,3%.

Quanto maior o nível do CDB Brasil, maior a percepção de risco sobre o país. Isso porque o título é um derivativo que tem como objetivo proteger o investidor de casos de não pagamento (calote) nas operações de crédito realizadas com agentes daquele país. Por isso, ele é como um “seguro” contra inadimplência.

Em maio, apareceram fatores na cena doméstica que exercem pressão extra sobre gastos públicos, o que deixa o mercado mais avesso ao risco.

Entre investidores estrangeiros, em rota de fuga do mercado brasileiros desde meados de janeiro, o noticiário político também torceu narizes. Sem eles, nem guindaste levanta o Ibovespa. Os gringos representam atualmente cerca de 28% de toda a força compradora na nossa bolsa. São os maiores, conforme dados da B3, mas já pesaram mais – no fim do ano passado, movimentavam 45% do capital transacionado.

“É até difícil colocar um só responsável pela queda de maio. Os ventos contra a bolsa vieram de todo lado”, diz Beto Saadia, economista e diretor de investimentos da Nomos. “Tivemos o Banco Central [BC] sinalizando uma divisão ideológica que teria extrapolado um pouco a discussão técnica sobre o corte na Selic. Do Planalto, a troca da presidência da Petrobras levantou desconfiança sobre a ingerência política e ainda trouxe um ponto de alerta para a pauta da meta fiscal. Isso porque, quando se projetam menos lucros para a companhia e, assim, menos dividendos, esses recursos, que são uma fonte importante de recursos para a União [acionista controlador da petroleira], são comprometidos.”

O especialista cita ainda a proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Quinquênio, que concede bônus salariais para magistrados e promotores. “É uma bomba fiscal”, descreve. A Consultoria de Orçamento, Fiscalização e Controle do Senado estima que a medida custará cerca de R$ 82 bilhões aos cofres públicos entre 2024 e 2026.

Também foi um mês marcado pelo desastre climático e humanitário no Rio Grande do Sul, que pode ter um impacto marginal no PIB do país e, em alguma medida, acelerar a inflação de alimentos.

Esse quadro mostra menos espaço para quedas da Selic, ferramenta de regulação dos preços no mercado. O ciclo de flexibilização dos juros por aqui foi posto em xeque já na última reunião do Copom, em 8 de maio, quando a maioria dos dirigentes decidiu “furar” o indicativo de corte de meio ponto sobre a taxa e reduzi-lo para corte de 0,25 ponto percentual.

Resultado: no boletim Focus, a estimativa para a Selic em 2024 saiu de 9,5% ao ano em 30 de abril para 10,5% ao ano no relatório divulgado na última semana de maio.

De acordo com o Termômetro do Copom do Valor Investe, 83% dos agentes do mercado apostam na manutenção da Selic em 10,5% ao ano na próxima decisão do Copom, em 19 de junho.

Ao cruzar esses cenários, temos um mercado majoritariamente convencido de que a Selic não cai mais este ano.

“Mesmo com dados positivos do PCE [indicador de preços] dos EUA em abril, nossa bolsa aqui sentiu o peso dos papéis ligados a commodities, entre eles, a Vale, que engatou queda após a divulgação de dados de atividade industrial em queda bem além da esperada”, pondera o analista de investimentos Rodrigo Cohen sobre o pregão de hoje.

Para o Brasil, a desaceleração econômica dos EUA ou da China representa menor demanda por commodities, o que tende a derrubar os valores das matérias-primas e pode afetar 35% das empresas na carteira do Ibovespa, de alguma forma ligadas a esse mercado.

A situação melhora para a bolsa brasileira?

As taxas de juros americanas, mantidas no intervalo dos 5,25% a 5,5%, maior patamar desde 2001, não dão espaço para o Ibovespa brilhar. O momento dele vai chegar? Sim, mas só quando o banco central dos EUA iniciar a flexibilização da sua política monetária. A questão não é se, mas quando o índice retomará seu lugar ao sol.

Quanto mais altas as taxas dos títulos públicos americanos (Treasury), mais o dólar tende a se valorizar globalmente. Isso acontece pela migração dos recursos no mundo todo para a segura e – nestas condições – atraentemente rentável renda fixa americana. Mesmo entre os ativos de risco, os dolarizados ficam mais interessantes aos investidores mais vorazes.

Só que, para competir com as Treasuries e frear a disparada do dólar (que funciona como um “canal” para a inflação), o BC precisa segurar a Selic em patamares mais elevados. Quer dizer, é um cenário periclitante o dos juros brasileiros hoje, com pressão de dentro e de fora para que a taxa siga em níveis restritivos (leia-se: nos dois dígitos).

Para o Ibovespa, a notícia é ruim por dois motivos: torna a renda fixa atrativa, então investidores não veem a necessidade de correr os riscos da renda variável; e penaliza os resultados das empresas.

As taxas de juros influenciam o custo do capital no mercado, porque, quando altas, funcionam como um gargalo à circulação de recursos. Por isso, os empréstimos (sejam para empresas ou consumidores) e as dívidas corporativas ficam mais caros, desestimulando o consumo.

Da perspectiva microeconômica, o custo da dívida segue alto para as empresas, o que, por si só, já piora as margens de rentabilidade e repele investidores.

Agora, para o dólar, junho guarda algum espaço para otimismo. “A princípio, se os dados de inflação dos EUA continuarem mostrando alta de preços mais controlada, a expectativa é que o dólar possa iniciar uma trajetória baixista” diz Cohen.

“Mas isso vai depender também do comportamento da política aqui no Brasil. Se não tivermos outras notícias ruins, a tendência é que o real se valorize em junho”, finaliza.

maldição horror poço tombo — Foto: Freepik
maldição horror poço tombo — Foto: Freepik



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