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Economistas e investidores divergem sobre Selic. E dá para ganhar com isso | Hora de Investir


Desde que a Selic entrou queda, em agosto, sobram especulações sobre qual será o último degrau alcançado na descida. As aposta de economistas, no entanto, estão descasadas das de investidores. E com a taxa básica ainda nos 12,25% ao ano, quem quiser lucrar com essa divergência tem de se mexer desde já.

  • Segundo levantamento feito pelo Valor Investe, a curva de juros futuros nacional embute a ideia de uma parada nos cortes na altura dos 10% ao ano cravados – conforme mostram as taxas de contratos de Depósito Interfinanceiro (DI). Nesse cenário, na sequência de alguns cortes de 0,50 ponto percentual, viria um derradeiro de 0,25 ponto em 31 de julho de 2024.
  • Já o Boletim Focus do Banco Central (BC), semana a semana, reúne estimativas de cerca de cem economistas brasileiros. E, em sua maioria, eles vislumbram hoje uma descida dos juros até os 9,25% ao ano. Se for de 0,50 ponto por vez, como tem sido, o ponto de chegada seria em 18 de setembro do ano que vem.

Ou seja, negociantes como gestores e investidores institucionais estão mais cautelosos do que a turma dedicada a projetar as decisões do BC, em sua maioria, os economistas das instituições. Na dose de 0,75 ponto de diferença. De forma geral, o primeiro bloco (gestores e investidores institucionais) pensa de uma forma mais micro, enquanto o segundo grupo se debruça muito mais em fatores macroeconômicos.

De acordo com analistas de investimentos, as previsões da pesquisa Focus devem se provar certeiras nos próximos meses. Em outras palavras, a realidade ainda não foi embutida nos preços dos contratos de juros futuros. Em outras palavras: isso significa que, mais dia, menos dia, a taxa dos contratos de juros deve cair 0,75 ponto, até se encontrar com os 9,25% que hoje é o consenso do Focus. E, sendo assim, há oportunidade de lucros tanto na bolsa quanto em ativos de renda fixa prefixados.

Por que, então, há essa diferença?

Negociantes podem até acreditar que a Selic vai cair até os 9,25% ao ano. Mas, como o seguro morreu de velho, preferem não pagar para ver, exigindo um prêmio a mais para se proteger de eventuais riscos contra essa projeção. Mais quais riscos?

“Na última semana, as discussões do déficit fiscal, da desoneração da folha de pagamento ficaram no radar e isso sensibiliza o mercado. Essas notícias movimentam muito os contratos futuros. Já no Focus, as projeções de algumas instituições financeiras podem até se ajustar, mas como pega a mediana das expectativas de muitas casas, o número não muda tanto“, explica Rodrigo Caetano, analista da Toro Investimentos.

As discussões fiscais em Brasília dão conta do empenho, ou não, do governo em manter a saúde das contas públicas em dia. Recentemente, falas do presidente Lula minimizando a importância de zerar o déficit em 2024 causaram estremecimento nessa confiança. No entanto, semanas depois, essa discussão pareceu superada, ao menos por enquanto, trazendo doses de calmaria aos pregões.

Toda essa “montanha-russa” de notícias, segundo analistas, faz com que os agentes financeiros adotem um comportamento mais cauteloso. Afinal, existem sinais mistos. Ora o governo sinaliza que terá um comportamento mais “gastão” (que traz mais inflação e, consequentemente, pode impedir mais cortes da Selic), ora ele acalma os investidores reiterando seu compromisso com o controle de gastos.

E o que isso significa para o meu bolso?

Caso o cenário do Focus se concretize, ele permite uma aceleração na exposição à renda variável e também a produtos de renda fixa com outros indexadores, como aqueles que têm mais volatilidade“, afirma Rodrigo Sgavioli, analista da XP. Ele explica que existem ativos de renda fixa prefixados hoje oferecendo retornos de 10,2% ao ano. Caso a Selic chegue a 9,25% ao ano, isso significa que os investimentos pós-fixados terão retornos semelhantes a esse valor. Portanto, os prefixados podem valer a pena.

O analista, no entanto, chama a atenção para um ponto: os investidores que querem comprar esses ativos prefixados a uma taxa mais atrativa não para carregá-los até o seu vencimento, mas sim para vendê-los na sequência, para ganhar com a marcação a mercado, podem não conseguir retornos tão bons devido ao imposto de renda. Afinal, títulos como os do Tesouro Direto seguem a regra de alíquota regressiva, ou seja, quanto mais tempo o seu dinheiro passa investido nos nossos títulos, menor será a cobrança de impostos sobre o seu investimento. E aplicações até seis meses pagam 22,5% de imposto de renda sobre os ganhos.

Caetano, da Toro, também vê boas oportunidades nos títulos prefixados a partir desse cenário. Ele afirma que esses ativos já vinham ganhando força desde que foi iniciado o ciclo de cortes da Selic, o que deve continuar daqui em diante.

“O prefixado [ Tesouro Prefixado] em 2024 deve ter um protagonismo maior na renda fixa. Os pós-fixados, por outro lado, perdem força. Então, uma alocação de pós-fixado [Tesouro Selic] só faria sentido em ativos de prazo menor, até dois anos. Já para os pré-fixados enxergamos um cenário ideal entre três e cinco anos, afirma. Segundo o analista, os títulos indexados ao IPCA [Tesouro IPCA+], por sua vez, são mais indicados para cenários de prazo maior. “Em ativos de longo prazo eles ainda fazem sentido, o rendimento oferecido hoje está bem legal”, diz.

Caetano lembra que a bolsa também pode se beneficiar ainda mais nesse cenário de corte de juros.

Embora a renda variável já esteja em recuperação, especialmente devido à Selic menor e ao apetite ao risco mundo afora, o analista acredita que há mais espaços para ganhos. Justamente porque todo o ciclo de cortes que levaria os juros a 9,25% ainda não foi absorvido pelo mercado.

“Atualmente, estamos tendo um rali interessante do Ibovespa, em um cenário bem positivo. Se de fato tivermos Selic abaixo de dois dígitos para 2024, com certeza o Ibovespa terá desempenho melhor do que o visto agora“, diz.

Para que esse rali continue, no entanto, será preciso mais do que o ciclo de corte de juros convergir ao apontado pela pesquisa Focus. “Existem oportunidades aqui e ali hoje? Sim. Mas os preços dos ativos da bolsa estão justos. Para a bolsa seguir em alta, será preciso também o cenário internacional colaborar“, diz Alexandre Espírito Santo, professor do IBMEC-RJ.

Resumindo a ópera, passa por outros juros o desempenho da bolsa brasileira. Os juros americanos. A depender da necessidade de mais ou menos taxas, pode haver mais ou menos atratividade para mercados emergentes. Dentre os quais, o brasileiro. Foi o que se viu nos últimos meses. Se a aposta em mais juros lá subia, a bolsa por aqui sofria, e vice-versa.

Samuel Ferrarezi, líder de investimentos do Santander, afirma que as projeções do banco vão em linha com as vistas no Focus. Ele destaca, porém, que alguns assuntos precisam estar no radar do mercado porque têm o poder de mexer com essas expectativas e, consequentemente, com o que seria indicado para o investidor.

“Primeiro, que o Brasil tem um desafio fiscal bastante importante. E um país que não cumpre seu lado fiscal, fica menos interessante. Então, o investidor estrangeiro exige mais prêmio para investir aqui”, afirma. “A questão fiscal é capaz de mudar o resultados dos modelos que o mercado está usando para fazer suas previsões“, diz.

Por fim, o especialista afirma que outro assunto que precisa ficar no radar é a inflação no Brasil. Afinal, com aceleração de preços, o ritmo dos cortes nos juros pode ficar comprometido.

Na última terça-feira (28), o IPCA-15, indicador conhecido como “prévia da inflação” veio acima do esperado ao mostrar um avanço de 0,33%.

A última leitura do IPCA, indicador de inflação perseguido pela autoridade monetária, mostrava uma alta dos preços menos acelerada do que o mercado esperava. Aquela surpresa postiva, no entanto, deu lugar a uma negativa. Diante disso, investidores podem entender que ainda não há espaço para o BC acelerar a dose dos cortes de juros, do atual ritmo de 0,50 ponto percentual por vez, para 0,75. Essa possibilidade vinha sendo especulada com base em falas consideradas otimistas do presidente da autoridade monetária, Roberto Campos Neto.

Portanto, ainda que os analistas acreditem no ciclo de cortes (e, consequentemente nas oportunidades em renda fixa e em títulos prefixados que ela traz), existem muitas variáveis que podem impactar o cenário e devem ser monitoradas pelos investidores

Corte de juros — Foto: Getty Images
Corte de juros — Foto: Getty Images



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