Desinflação na América Latina pode desacelerar, diz FMI | Investimento no Exterior
O processo desinflacionário na América Latina, daqui para a frente, pode se tornar mais lento e desafiador e vai ser muito importante o esforço dos bancos centrais para colocar os indicadores perto das metas, avaliou o diretor para o Hemisfério Ocidental do Fundo Monetário Internacional (FMI), Rodrigo Valdés, durante evento para divulgação do relatório “Cenário Econômico na América Latina e Caribe”, elaborado pelo órgão. “Não teremos toda a desinflação que tivemos de inflação, porque o nível de preços não está voltando ao nível pré-inflacionário”, disse.
Segundo Valdés, “temos um pouco de desinflação, mas os preços estão mais altos”. Conforme o diretor do FMI, apesar da resiliência econômica nos maiores países da região, “vemos desaceleração [das economias] em quase todos os lugares [na América Latina], mas é uma desaceleração normal, saudável e esperada”. Para o diretor do FMI, “este estágio, não temos nenhuma crítica para bancos centrais na região ou o que têm feito”.
Valdés disse esperar que a inflação na região comece a convergir para as metas a final deste ano ou em 2024, se não houver novos choques na economia. O dirigente observou, no entanto, que os núcleos de inflação têm estado mais resistentes à queda e, apesar de os preços estarem diminuindo, ainda não voltaram ao patamar pré-pandêmico.
Um dos desafios para a América Latina vem dos juros americanos. “A economia nos EUA tem se mostrado muito forte, mas a inflação tem caído gradualmente”, avaliou Valdés. “O crescimento nos Estados Unidos [nos últimos trimestres] foi muito, muito forte, e isso também move a agulha para as previsões”, acrescentou.
O cenário de economia resiliente e inflação em queda, mas com alguma resiliência dos núcleos, tem levado à perspectiva de juros elevados por mais tempo, ressaltou. “O PIB americano tem trazido números fortes nos últimos trimestres, com demanda resiliente, mas o mercado de trabalho tem desacelerado gradualmente”, disse.
Valdés ponderou que as condições monetárias “continuam apertadas e o dólar tem estado particularmente forte [no atual estágio da política monetária nos EUA]”. O diretor do FMI ressaltou ainda ver incertezas para 2024 ocasionadas pelo salto do déficit fiscal dos EUA. Em apenas um ano, de 2022 para 2023, houve um crescimento de quatro pontos percentuais no déficit em relação ao PIB. “Houve aumento significativo do déficit fiscal nos EUA em 2023, com incertezas para 2024”, considerou. Segundo o especialista, o déficit saiu de menos de 2% em relação ao PIB há um ano para cerca de 6%.
Uma questão importante no atual ciclo de combate à inflação global é se haverá um “descolamento” entre os países, afirmou o diretor de política econômica do Banco Central, Diogo Guillen, durante o evento do FMI e Fundação Getulio Vargas (FGV) sobre o cenário econômico para América Latina e Caribe.
“Dados os choques globais, houve uma correlação [de alta da inflação] em todo o mundo, e agora a grande questão é se veremos uma desacoplagem [com diferentes ciclos de política fiscal e monetária] ou não em diferentes países”, afirmou. O dirigente do BC brasileiro lembrou que o processo de desinflação ocorre em etapas. Em um primeiro estágio, os indicadores caíram de cerca de 9% ao dano para o patamar em torno de 4%. “Esse primeiro estágio é menos custoso, e está mais ligado a preços como o das commodities e dos administrados.”
No entanto, em um segundo momento, o processo de queda da pressão sobre preços se torna mais lento e depende de uma postura mais cautelosa da política monetária. “Essa fase está mais relacionada a fundamentos [econômicos] e às expectativas [sobre inflação futura]”, disse.
Conforme o diretor do BC, “não estamos sozinhos, muitas coisas que vemos no Brasil estão acontecendo em outros países”. O dirigente destacou que o processo inflacionário tem diversas particularidades. “É o mesmo espírito de descascar a cebola da inflação”, comparou. “Desvendar as camadas [das forças que têm moldado o cenário econômico].” Guillen citou a resiliência do mercado de trabalho. “Continuamos a ver contratações, mas não vemos pressões em salários.”
(Com supervisão de Talita Moreira)