
Alta dos juros globais não deve impedir a continuidade dos cortes na Selic, diz Bradesco | Moedas e Juros
O recente período de estresse nos mercados globais de juros elevou a volatilidade dos ativos financeiros e ampliou incertezas sobre o quão longe os os bancos centrais emergentes poderiam estender seus ciclos de afrouxamento monetário. Para o Bradesco, no entanto, ainda que o diferencial dos juros entre o Brasil e os Estados Unidos esteja perto de suas mínimas históricas, o aumento dos juros internacionais não deve, por ora, impedir a continuidade do relaxamento monetário no Brasil.
De acordo com o economista Marcelo Gazzano, ao se comparar a diferença entre a Selic e os Fed funds, bem como as taxas de mercado dos países de um, cinco e de sete anos descontadas as expectativas de inflação, o nível atual do diferencial de juros é um dos menores desde o início do século.
“O nível atual é um dos menores da série histórica e, de fato, deveríamos esperar uma redução desse diferencial quando olhamos uma perspectiva histórica como essa, pois houve avanços institucionais na economia brasileira. Além disso, a própria redução da meta de inflação ajuda a diminuir a taxa nominal de juros”, aponta o economista.
Gazzano lembra que, apesar de a chave para a determinação da Selic ser o desvio das expectativas de inflação em relação ao centro da meta, “que é condizente com um Banco Central determinado a seguir a meta de inflação”, também não é possível dizer que o câmbio ou a taxa de juros internacional sejam menosprezados nas tomadas de decisão de política monetária.
“Como a taxa cambial tem impacto relevante sobre a inflação e as expectativas de inflação — nossas estimativas indicam um repasse de pouco mais de 5% da variação cambial para os preços domésticos —, o BC sempre se mostra atento às oscilações do real. Além disso, há alguma evidência de que as taxas de juros internacionais ajudam a explicar a dinâmica da taxa neutra doméstica”, escreve o economista em relatório enviado a clientes.
No entanto, de acordo com o estudo elaborado pelo Bradesco, não há uma relação mecânica entre os juros externos e a taxa praticada no Brasil. “Apesar de, teoricamente, o diferencial de juros ter impacto sobre as variações da moeda, empiricamente esse efeito não é encontrado de maneira conclusiva na literatura. De qualquer modo, mudanças muito abruptas ou relevantes no diferencial de juros trazem cautela e devem ser monitoradas de perto, já que, em tese, deveriam ter impacto sobre a moeda e sobre o juro neutro, ambos com consequências sobre a trajetória futura de inflação”, aponta.
Um exemplo, segundo o estudo, é o que ocorreu em 2020, quando os juros caíram significativamente para reduzir o impacto recessivo da pandemia e o câmbio se aproximou de R$ 6 por dólar.
Assim, Gazzano fez algumas simulações para a taxa de câmbio e, consequentemente, seu impacto sobre a inflação, expectativas e trajetórias esperadas para a taxa Selic. Segundo o estudo, assumindo uma taxa real neutra de 5% — valor atualmente adotado pelo Bradesco —, é pouco provável que o ponto terminal dos juros brasileiros fique acima dos 10%. Nesse caso, a taxa Selic só ficaria acima dos 10% se o câmbio for a R$ 5,75.
Por outro lado, assumindo uma taxa de juro neutro de 6% em termos reais, o aumento dos juros nos EUA cobraria um preço mais elevado sobre a taxa de equilíbrio doméstica do que nossos modelos sugerem hoje. “Nesse caso, e com taxas de câmbio significativamente mais depreciadas, o modelo sugere uma Selic terminal ao redor de 11%”, afirma o economista.
“A conclusão é que, por enquanto, o aumento das taxas de juros no mercado internacional não será capaz de impedir a continuidade do relaxamento monetário no Brasil. Além disso, a taxa de câmbio será medida importante para definir a extensão do ciclo. Nossa expectativa é que o real terá uma leve apreciação até o final do ano que vem e, portanto, a Selic irá terminar 2024 abaixo de 10%, por ora, em 9,25% em nosso cenário base”, conclui.
